Comentavam os apóstolos, entre si, qual a conduta mais aconselhável diante do Todo- Poderoso, quando o Mestre narrou com brandura:
— Certo rei, senhor de imensos domínios, desejando engrandecer o espírito dos filhos
para conferir-lhes herança condigna, conduziu-os a extenso vale verdoengo e rico de seu enorme
império e confiou a cada um determinada fazenda, que deviam preservar e enriquecer
pelo trabalho incessante. O Pai desejava deles a coroa da compreensão, do amor e da sabedoria,
somente conquistável através da educação e do serviço; e, como devia utilizar material transitório,
deu-lhes tempo marcado para as construções que lhes seriam indispensáveis, mais tarde,
aos serviços de elevação. Assim procedia, porque o vale era sujeito a modificações e chegaria
um momento em que arrasadora tempestade visitaria a região guardando-se em segurança
apenas aqueles que houvessem erguido forte reduto. Assim que o soberano se retirou, os
filhos jovens, seguidos pelas numerosas tribos que os acompanhavam, descansaram, longamente,
deslumbrados com a beleza das planícies banhadas de sol. Quando se levantaram para a
tarefa, entraram em compridas conversações, com respeito às leis de solidariedade, justiça e
defesa, cada qual a exigir especiais deferências dos outros. Quase ninguém cuidava da aplicação
dos regulamentos estabelecidos pelo governo central. Os príncipes e seus afeiçoados, em
maioria, por questões de conforto pessoal, esmeravam-se em procurar recursos sutis com que
pudessem sonegar, sem escândalos visíveis entre si, os princípios a que haviam jurado obediência
e respeito. E tentando enganar o Magnânimo Pai, por meio da bajulação, ao invés de honrá-
lo com o trabalho sadio, internaram-se em complicadas contendas, em torno de problemas
íntimos do soberano.
Gastaram anos a fio, discutindo-lhe a apresentação pessoal. Insistiam alguns que ele revelava
no rosto a brancura do lírio, enquanto outros perseveravam em proclamar-lhe a cor
bronzeada, idêntica à de muitos cativos de Sídon. Muitos afirmavam que ele possuía um corpo
de gigante e não poucos exigiam fosse ele um anjo coroado de estrela.
Ao passo que as rixas verbais se multiplicavam, o tempo ia-se esgotando e os insetos
destruidores, infinitamente reproduzidos, invadiram as terras, aniquilando grande parte dos
recursos preciosos. Detritos desceram de serras próximas e fizeram compacto acervo de monturo
naquelas regiões, enquanto os príncipes levianos, inteiramente distraídos das obrigações
fundamentais que lhes cabiam, se engalfinhavam, a todo instante, a propósito de ninharias.
Houve, porém, um filho bem-avisado que anotou os decretos paternais e cumpriu-os.
Jamais esqueceu os conselhos do rei e, quanto lhe era possível, os estendia aos companheiros
mais próximos. Utilizou grande número de horas que as leis vigentes lhe concediam ao repouso
e construiu sólido abrigo que lhe garantiria a tranqüilidade no futuro, semeando beleza e
alegria em toda a fazenda que o genitor lhe cedera por empréstimo.
E assim, quando a tormenta surgiu, renovadora e violenta, o príncipe sensato que amara
o monarca e servira-o, desvelado e carinhoso, estendendo-lhe as lições libertadoras, pela fraternidade
pura, e cumprindo-lhe a vontade justa e bondosa, pelo trabalho de cada dia, com as
aflições construtivas da alma e com o suor do rosto, foi naturalmente amparado num santuário
de paz e segurança que os seus irmãos discutidores não encontraram.
Doce silêncio pairou na sala singela...
Decorridos alguns minutos, o Mestre fixou os olhos lúcidos na pequena assembléia e
concluiu:
— Quem muito analisa, sem espírito de serviço, pode viciar-se facilmente nos abusos da
palavra, mas ninguém se arrependerá de haver ensinado o bem e trabalhado com as próprias
forças em nome do Pai Celestial, no bendito caminho da vida.
Jesus No Lar - Chico Xavier por Neio Lúcio
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